10 de março 2018

10 de março 2018
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terça-feira, 28 de outubro de 2025

A DOUTRINA ECLESIÁSTICA DO PECADO

 A Doutrina Eclesiástica do Pecado

(Versão com análise hebraica e grega — teológico-literária)

A doutrina eclesiástica do pecado é uma das colunas mestras da fé cristã, pois trata da relação entre a santidade de Deus e a corrupção do homem. Nenhum tema é mais decisivo para a compreensão da redenção do que o pecado, pois ele é o abismo moral e espiritual que separa o Criador de Sua criatura.


1. A origem e natureza do pecado

Na Escritura, o pecado é descrito como um rompimento da aliança. O termo hebraico mais usado para “pecado” é חַטָּאת (chattā’t), proveniente da raiz חָטָא (chātā’), que literalmente significa errar o alvo.

Essa expressão revela que o pecado é mais que uma falha moral: é o desvio do propósito divino, a distorção da vontade humana em relação à vontade de Deus. O homem peca quando troca o centro — Deus — pelo próprio ego.

Outros termos hebraicos também ampliam o sentido:

עָוֹן (‘avon) — indica iniquidade, perversão moral, a deformação interior do caráter.

פֶּשַׁע (pesha’) — significa rebelião, transgressão consciente, sugerindo o ato deliberado de romper com a autoridade divina.

Essas três palavras aparecem repetidamente nas Escrituras para expressar o pecado em suas dimensões distintas: erro, corrupção e rebeldia. Isaías 53:5 declara:

“Mas ele foi ferido pelas nossas פְּשָׁעִים (pesha‘im), e moído pelas nossas עֲוֹנוֹת (‘avonot).”

Aqui se vê o poder da redenção: o Servo Sofredor carrega não apenas os erros, mas a perversão e a rebeldia de toda a humanidade.

No Novo Testamento, o termo grego predominante é ἁμαρτία (hamartía), igualmente traduzido como “errar o alvo”. A palavra descreve a condição universal do homem: “Todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Romanos 3:23).


2. O pecado original e sua herança

Segundo a tradição eclesiástica, o pecado não é apenas um ato, mas um estado hereditário.

Adão, como cabeça federal da raça humana, introduziu o pecado no mundo (Romanos 5:12).

No hebraico, o relato de Gênesis 3 não descreve apenas um erro, mas uma quebra da palavra (davar) — e, portanto, da comunhão. O homem deixou de ouvir a voz divina (qôl Elohim) e preferiu a voz da serpente.

Essa ruptura foi mais do que moral; foi ontológica: afetou a própria estrutura do ser humano.

A Igreja ensina que a natureza humana, desde então, carrega uma tendência (yetzer) ao mal — conceito já presente em Gênesis 6:5:

“Toda a imaginação (yetzer) dos pensamentos do seu coração era só má continuamente.”

Assim, a teologia entende que o pecado é a doença da alma e a deformação da imagem divina no homem.


3. As dimensões do pecado

O pecado é pessoal, coletivo e cósmico.

Pessoal, porque nasce no coração — “O coração é enganoso mais do que todas as coisas” (Jeremias 17:9).

Coletivo, porque corrompe estruturas e sistemas, como denunciavam os profetas.

Cósmico, porque toda a criação geme sob seus efeitos (Romanos 8:22).

A tradição eclesiástica reconhece, portanto, que o pecado não é mero comportamento, mas um poder espiritual que contamina a totalidade da criação.


4. As consequências espirituais

O salário do pecado é a morte (θάνατος – thánatos), isto é, separação de Deus.

A primeira consequência foi a perda da comunhão: Adão se escondeu da presença divina (pānîm YHWH).

Depois veio a culpa (‘asham) e o medo, que são os sintomas espirituais da ruptura.

O homem tornou-se cativo de si mesmo, incapaz de se libertar pela própria força. Por isso, Agostinho declarou: “Non posse non peccare” — o homem, em seu estado decaído, não pode deixar de pecar.


5. O remédio eclesiástico: graça e arrependimento

A resposta divina ao pecado não foi destruição, mas redenção.

Em Cristo, Deus tomou sobre Si a culpa do homem. A cruz é o ponto em que a justiça e a misericórdia se encontram.

A graça (cháris, no grego; chen, no hebraico) é o remédio que restaura o pecador e o reconduz à comunhão perdida.

A Igreja, como corpo de Cristo, é o instrumento da graça: proclama o arrependimento, administra os sacramentos e orienta o homem à santificação.

João escreve:

“Se confessarmos os nossos pecados (hamartías), Ele é fiel e justo para nos perdoar” (1 João 1:9).

O perdão é mais que absolvição; é reconfiguração espiritual, um novo nascimento (gennēthēnai ánōthen).


6. O propósito doutrinário e pedagógico

A doutrina eclesiástica do pecado não busca apenas condenar o homem, mas conduzi-lo ao arrependimento e à graça. Ela revela o abismo da culpa para exaltar a altura da misericórdia. Onde o pecado abundou (epleonasen), a graça superabundou (hyperperisseusen), como afirma Paulo (Romanos 5:20).

Reconhecer o pecado é o início da sabedoria espiritual. O homem que se vê caído tem a oportunidade de ser levantado pela cruz.


Conclusão

O pecado é a ferida; Cristo é o bálsamo. O pecado é o abismo; Cristo é a ponte.

A doutrina eclesiástica do pecado revela o drama humano e, ao mesmo tempo, a esperança divina. O homem, criado à imagem de Deus, perdeu-se no labirinto do ego; mas pela graça, reencontra o caminho da comunhão.

O homem honrado não necessita ser lembrado; sua história o faz eterno. Já o que busca a honra sem ter caminho, vive de reflexos e sobrevive do esquecimento. Pois a verdadeira honra não se dá, conquista-se; não se impõe, revela-se; e não se compra, vive-se.


Pense nisso!

Cezar Jr Gomes

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